A
maioria dos usuários de toca-discos não têm seu aparelho bem regulado e
realizando todo potencial musical. E essa maioria não possui discos de
testes, têm acesso à equipamentos de medição ou à aparatos
especializados. Sendo um assunto extenso e um tanto polêmico, onde algumas
pessoas sustentam que ele só pode ser abordado corretamente de modo científico,
ou seja, com uso de uma série de aparatos que incluem osciloscópio e
discos de teste, este guia é mais lúdico, prático e ‘musical’ do que
propriamente científico.
Confiem em seus ouvidos!
Como o velho e bom toca-discos está no mercado, e nas casa dos audiófilos,
há várias décadas, como não é tecnologia nova, sustentamos aqui domá-lo
como um ‘bicho de uma cabeça’, em vez de sete. É, portanto, um guia fácil
que todos podem seguir para checar a regulagem de seus toca-discos ou mesmo
melhorá-la.
Precauções – um toca-discos, principalmente o conjunto braço / cápsula
/ agulha, é uma peça de mecânica de precisão bastante frágil e cara.
Portanto, se você não se sente seguro ao mexer com esse tipo de tecnologia
ou não possui as ferramentas adequadas, sugerimos procurar um técnico
especializado. Uma cápsula ou agulha danificada na manipulação pode
significar prejuízo de milhares de dólares.
Nivelamento – a primeira coisa a ser verificada para seu correto
funcionamento é se o toca-discos está em uma superfície firme, longe das
caixas-acústicas e de outras fontes de vibração e, principalmente, se o
mesmo está nivelado. Para tal, um nível tipo bolha comum, geralmente
utilizado por marceneiros, é o suficiente. É possível encontrar nível-bolha
redondo, que permite a leitura da inclinação do aparelho ao mesmo tempo
para todos os lados, facilitando o processo. Em caso de haver inclinação,
a mesma pode ter como causa tanto o móvel onde o aparelho está quanto o
aparelho em si. Muitos toca-discos possuem regulagem de altura em seus pés
ou no sistema de suspensão / amortecimento, para tanto é preciso checar o
manual do mesmo. Se o móvel estiver desnivelado será preciso calçá-lo
ou, como piso muito irregular, muda-lo de lugar.
Checagem
mecânica – uma checagem mecânica geral do sistema base / motor /
prato do toca-discos é essencial para garantir uma rotação constante e
silenciosa. Um motor barulhento transfere esse barulho em forma de vibrações
tanto para a base quanto para o prato e, conseqüentemente, durante a audição,
para o conjunto cápsula / braço. A lubrificação do motor é algo
simples, mas que deve ser feito com o tipo de lubrificante indicado pelo
fabricante do toca-discos. A mesma coisa deve ser seguida em relação ao
eixo central do prato, que deve girar livremente e com baixíssima fricção.
No caso do toca-discos ser tipo belt-drive (com acionamento por correia) ou
por polia de borracha, a mesma deve estar limpa e desengordurada, e não
pode estar folgada. Uma correia folgada ou cuja borracha esteja ressecada e
rachada pode estar patinando e, portanto, trazendo oscilações de
velocidade. Uma boa reprodução sonora depende da velocidade estar o mais
estável possível.
Azimuth
do Shell/cápsula – um azimuth regulado é quando a haste da agulha
(cantilever) está perfeitamente perpendicular à superfície do disco. Isso
é fácil de visualizar olhando a cápsula de frente, com a agulha pousada
sobre o disco – o corpo da cápsula tem que estar paralelo ao disco, sem
tender para a esquerda ou direita. Esse desalinhamento pode ser causado pelo
shell (extremidade do braço onde é parafusada a cápsula) torto ou mal
encaixado, pelo braço torto, ou por cápsula mal presa ao shell – e
resultado imediato dele pode ser desequilíbrio entre canais, e desgaste
irregular à longo prazo. O manual do braço costuma trazer instruções
para tal realinhamento.
Posicionamento
e Alinhamento da cápsula no shell – para o correto posicionamento da
cápsula no shell faz-se necessário o uso de um gabarito. É possível
produzir ou desenhar um gabarito especificamente para o braço do seu
toca-discos, mas obtém-se resultados plenamente satisfatórios com
gabaritos prontos. Logo abaixo você verá links para o download de dois
modelos gratuitos de gabaritos para esse alinhamento - também chamados de
Protractors (veja nas imagens acima). Basta fazer o download, imprimir o
Protractor, fazer o furo para o pino central do prato e inseri-lo no mesmo.
Estando a cápsula já colocada no Shell, a idéia é levar o braço até o
primeiro ponto de alinhamento, onde a ponta da agulha deve estar quase
tocando o ponto indicado para ela e, ao mesmo tempo, as laterais da cápsula
devem estar alinhadas com as linhas paralelas indicadas no gabarito. Basta
afrouxar um pouco os parafusos da cápsula, alinhar a mesma de acordo com o
gabarito, e prender os parafusos novamente. Girando-se um pouco o prato,
deve se levar a ponta da agulha até o segundo ponto de alinhamento, mais ao
centro do disco. Se ali sua cápsula / agulha mostrar-se igualmente
alinhada, parabéns! Caso o alinhamento esteja um pouco fora, é preciso
afrouxar os parafusos da cápsula de novo e posicioná-la de maneira que a
agulha fique igualmente próxima nos dois pontos e o corpo da cápsula fique
paralelo às linhas em ambos pontos. Dificilmente este alinhamento mostra-se
igualmente preciso nos dois pontos, até porque existem muitas diferenças
entre tamanhos de braços, de Shell e de cápsulas, portanto o ponto médio
de alinhamento é o objetivo.
Clique no link para baixar diversos Gabaritos de Alinhamento
(Protractors):
http://www.vinylengine.com/cartridge-alignment-protractors.shtml
Manuais variados de braços e cápsulas para download (em inglês) em www.vinylengine.com.
Regulagem
do contrapeso do braço – ou da força de trilhagem da agulha –
alguns braços possuem um contrapeso para fazer o equilíbrio do braço com
a cápsula e outro, com uma escala, para se definir qual o peso ou força de
trilhagem (tracking force) com o qual a cápsula trabalhará. A maioria dos
toca-discos, entretanto, usa um só contrapeso para as duas funções. Em
qualquer dos casos, segurando o braço cuidadosamente pelo shell, gira-se
(ou desliza-se) o contrapeso principal até que, quando solto, o braço
flutue paralelo ao prato, como se fosse uma daquelas balanças antigas
equilibradas – podem ser necessárias várias tentativas até atingir esse
equilíbrio, já que é um processo de precisão. Nesse momento, o peso de
trabalho, de trilhagem, da agulha sobre o disco é zero. Para continuar,
devemos travar o braço do toca-discos novamente em seu apoio de repouso. Se
houver um contrapeso específico, com escala numérica, para definição do
peso de trabalho da agulha, então basta gira-lo (ou desliza-lo, dependendo
do braço) até que atinja o peso especificado pelo fabricante da cápsula.
Normalmente os fabricantes de cápsulas especificam um peso, por exemplo,
entre 1,5 e 2 gramas. Recomendamos, nesses casos, utilizar o peso máximo
recomendado pelo fabricante da cápsula. Se o braço possuir apenas um
contrapeso para as duas funções, então o procedimento geral é de, após
atingir o ‘zero’, o equilíbrio, e voltarmos o braço ao descanso,
segurarmos cuidadosamente o contrapeso com uma mão e, com a outra mão
girarmos o anel onde está marcada a escala numérica de peso até que a
mesma fique com o número zero voltado para cima. Agora, com uma mão só,
giramos novamente o contrapeso principal, no sentido anti-horário (olhando
de frente) até que o anel com a escala marque o peso determinado para a cápsula.
As informações sobre os contrapesos, escalas e sua operação estão
disponíveis nos devidos manuais de cada modelo / marca de braço. A precisão
deste processo é importante, pois o resultado sonoro pode ser muito
diferente com uma variação de até meio décimo de grama.
Regulagem
do VTA – o ângulo de tração vertical do braço é normalmente
ajustado com uma regulagem disponível na base do braço, permitindo alteração
na altura do mesmo a partir da base, cuja regulagem inicial ideal é a do
braço paralelo ao disco enquanto este estiver tocando. Esse é ponto de
partida para o ajuste do VTA. O VTA tem a ver com o ângulo no qual a agulha
entra no sulco, então muitos fabricantes de cápsulas já sugerem o melhor
posicionamento do braço como, em muitos casos, com a base da cápsula
paralela ao disco. Com o braço muito alto, ou seja, com um ângulo a partir
do shell muito aberto, a tendência do som do toca-discos é de ter falta de
graves. Com o ângulo muito fechado os graves podem distorcer e até pode
haver perda de agudos. Será preciso experimentar variações na altura do
braço até obter a melhor sonoridade para cada cápsula. Em toca-discos com
braços que não possuem regulagem de VTA, e a cápsula está com um ângulo
muito aberto – ou seja, está mais baixo do lado da cápsula e mais alto
do lado da base do braço – é possível fechar esse ângulo, obtendo
melhor resposta de graves, simplesmente por adicionar espaçadores entre a cápsula
e o shell. Aqui é preciso cuidado para usar espaçadores que tenham apenas
alguns poucos milímetros de espessura, que sejam de material idealmente não
magnético e que sejam muito leves, para haver a menor alteração possível
na massa (peso) da cápsula. É preciso lembrar também que, ao adicionar
algum espaçador, será preciso regular novamente a força de trilhagem
através do contrapeso do braço como visto acima.
Regulagem
do anti-skating – skating é a tendência do braço deslizar, enquanto
estiver tocando, em direção ao centro do prato. Algumas marcas de braço não
possuem a correção chamada de anti-skating, porém nos braços que possuem
essa regulagem o indicado é que use um valor que é aproximadamente metade
do valor do peso de trilhagem (tracking force). Se sua cápsula trabalha, e
está regulada para, por exemplo, 2 gramas, use 1 grama no anti-skating. O
skating causa desgaste maior de um lado da agulha, desgaste da suspensão da
agulha (que fica no topo do cantilever) e desgaste errado do sulco do disco.
Uma trilhagem correta, com o anti-skating compensado, traduz-se também em
uma melhor qualidade sonora.
Manutenção – com o uso apropriado do toca discos, sem danos à
agulha, evitando poeira, trancos ou mudanças de temperatura, a regulagem
bem feita de um bom toca-discos deve durar meses, se não anos.